Resenha: O Pêndulo de Foucault | de Umberto Eco



Ficção, realidade ou conspiração? Poucos livros me deram tanto trabalho quanto esse.  Provavelmente o melhor que li esse ano, e ainda preciso ler ao menos mais umas duas vezes para absorvê-lo direito. Consegui pegá-lo na biblioteca aqui do meu bairro e quase não deu para entregar no prazo, apesar de já ter lido livros de 600 páginas em bem menos tempo que dois meses. Vou tentar explicar o porquê e transmitir a impressão que essa obra estonteante de Umberto Eco me passou até agora.

Dividida em dez partes, cada uma levando o nome de uma "sefira" da cabala, essa obra exibe ao início dos capítulos trechos inquietantes de livros antigos ligados às ciências ocultas, alguns ininteligíveis, em outros idiomas. Daí já se pode ter uma ideia do que se tem pela frente.

No começo, a narrativa lembra vagamente aqueles livros que jogam o leitor em uma situação tensa e retorna com as lembranças do protagonista, no caso, o narrador, para ir explicando aos poucos como ele foi parar ali. O cenário é o Conservatório de Paris, um museu onde o personagem que acabamos de conhecer está tentando se esconder para ali permanecer durante a noite e testemunhar uma reunião secreta. Mas desde a primeira linha a leitura flui meio devagar, e a causa disso não é nem um vocabulário complicado, mas o tom meio tresloucado do narrador, que mais confunde que explica. Por outro lado, porém, por páginas e mais páginas a obra parece se transformar em um livro de história específica de seitas e guerras religiosas, dando de início destaque à questão dos Templários, origem e transformações dessa ordem. É que os personagens principais estão desde o início envolvidos em uma pesquisa sobre ocultismo, e essa pesquisa é toda jogada na cara do leitor, nem de longe tão mastigada quanto na maioria dos livros de ficção.

Não se pode dizer que não existe uma "história" em "O Pêndulo de Foucault", mas não tiro a razão de quem desiste dela. Por vezes, me parecia estar lendo um daqueles romances de ficção científica que meu pai traz do sebo, mas são momentos bem raros até se chegar à metade do livro. É preciso muita força de vontade para seguir lendo centenas de páginas com uma narrativa tão densa, sempre interrompida, até começar a entender a tal situação tensa do início. O esforço é muito maior do que em qualquer outro livro que eu tenha lido, incluindo "Notre Dame de Paris" com seus capítulos gigantes que simplesmente param a história para ficar comparando arquitetura e literatura. E olha que eu me interesso bastante sobre religiões e ocultismo. Creio que a salvação desse livro é o jeito sempre bem humorado que o autor usa para contar as dezenas de histórias que tem "na manga", dando uma amenizada no excesso de informação. Podemos nos consolar lembrando que Umberto Eco leu mais de mil livros para escrever esse, portanto estamos tendo menos trabalho do que ele.

Entretanto, é bom observar que, apesar do efeito psicológico que a pesquisa provoca nos personagens, a impressão geral que o livro passa é de puro ceticismo. A organização ocultista que aparece busca um segredo tão secreto que ninguém sabe qual é, e o fanatismo digno do tribunal do santo ofício de seus membros leva a uma verdadeira tragédia (Umberto Eco sendo Umberto Eco).
Esse pessoal passa bem longe do nirvana. Mas isso não quer dizer que não haja palavras de sabedoria e lucidez no livro. Ao final, a mensagem é até bonita, e pode ou não amenizar a angústia que nos acompanha na maior parte do livro.

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